[ENG] Afro-descendant, hailing from Braga, and a journalist, Júlia M. Tavares holds a degree in Communication Sciences from the Faculty of Philosophy and Social Sciences at the Portuguese Catholic University. Now living in the Portuguese capital, she interned at Mensagem de Lisboa and the newspaper Público as part of the Diversity in Media programme with the support of the Aga Khan Development Network. She writes and seeks to explore, above all, the stories that breathe life into the streets of Lisbon.
Esta perspetiva, desenvolvida por pensadores como o sociólogo Aníbal Quijano, o semiólogo Walter Mignolo e a académica Catherine Walsh, aprofunda a compreensão deste conceito através de diversas perspetivas e disciplinas, contribuindo significativamente para a análise da decolonialidade — uma abordagem que desafia e procura desmantelar as estruturas de poder do colonialismo, transformando as formas de saber, ser e poder, moldadas por ele. Ao desafiar estas formas estabelecidas de conhecimento, sugere a valorização de conhecimentos, culturas e identidades que foram marginalizadas ou suprimidas, propondo um mundo onde múltiplas epistemologias e experiências possam coexistir e ser reconhecidas. Esta linha de pensamento foi o ponto de partida para o debate na mesa-redonda da convenção do festival MIL 2023, onde se discutiu a capacidade das instituições culturais de se libertarem das lógicas de poder e da hegemonia histórica eurocêntrica que fundamentam o sector cultural.
Na sua reflexão durante a mesa-redonda do festival, o historiador e ativista antirracista José Augusto Pereira falou sobre como o Renascimento do Harlem, um movimento cultural afro-americano que surgiu no início do século XX, é um exemplo sobre o que é a tensão dialética de centro e periferia, uma vez que este movimento artístico, protagonizado por pessoas negras, “não teria sido possível sem a existência da discriminação enfrentada durante essa época”. Depois do fim da Guerra Civil em 1865, centenas de milhares de afro-americanos, recentemente libertados da escravatura no Sul, viram-se sob o domínio das leis de segregação racial “Jim Crow”, que os reconfiguravam como cidadãos de segunda classe. Vítimas de ódio racial, linchamentos e campanhas de terror orquestradas por grupos como a Ku Klux Klan (KKK), viram-se obrigados a fugir do Sul, estabelecendo-se em cidades como Chicago, Los Angeles, Detroit e Nova Iorque. Nesta altura, o bairro do Harlem, em Manhattan, destacou-se como o local com a maior concentração de afro-americanos, atingindo quase 175 mil habitantes. Desde trabalhadores não qualificados até pessoas de uma classe média instruída, todos partilhavam experiências da escravatura, emancipação e opressão racial, bem como a determinação em criar uma nova identidade como pessoas livres — e, assim, surgiu o Renascimento do Harlem. Marcado por um crescimento significativo da expressão artística e intelectual da comunidade afro-americana, este movimento cultural, social e artístico quis romper com a homogeneidade cultural, enquanto enaltecia o orgulho negro na América, durante as décadas de 1920 a 1930.
Manifestações culturais e artísticas como o Renascimento do Harlem são formas de resistência a esses processos e não ocorrem nos lugares percebidos como centrais, embora entrem no diálogo do confronto com o centro. E até aos dias de hoje, ainda lidamos com esta construção de centro e periferia.
Na visão do cantor Luca Argel, a indústria cultural funciona de forma etnocêntrica, ou seja, avalia outras culturas com base nos padrões e valores da própria cultura, considerando-a como superior ou mais “normal”. Uma “expressão materializada do etnocentrismo”, no que diz respeito ao sector cultural, é o “género world music”, afirmou o cantor durante o debate. Utilizado para descrever músicas que não se enquadram nas categorias convencionais da música popular ocidental, que se posiciona como neutra, foi originalmente cunhado na década de 1980, em Londres, para comercializar a música africana popularizada pelo álbum Graceland, de Paul Simon. Rapidamente, passou a englobar qualquer música fora dos géneros mainstream como pop, rock, jazz e clássica. Contudo, vários críticos argumentam que essa categorização simplifica em excesso, perpetua estereótipos culturais e ignora a diversidade e complexidade das tradições musicais globais, contestando o uso deste conceito como antiquado e ofensivo num mundo cada vez mais globalizado, onde as influências musicais se cruzam constantemente.
“No fundo, [as instituições] têm um interesse superficial em dar um pouco de visibilidade a estas questões, na medida em que as possam transformar em conteúdo [lucrativo]”, salienta Luca Argel. Refletindo sobre as palavras do rapper Xullaji, destaca que o simples consumo da cultura negra e cigana não equivale a avanços significativos no respeito aos direitos humanos dessas minorias. Permitir apenas progressos superficiais na discussão não incita uma reflexão crítica sobre a hegemonia e os privilégios mantidos. predominantemente, por homens brancos héteros cigénero e ricos, nunca chegando ao ponto de questionar, verdadeiramente, os detentores desses privilégios.
Um longo caminho para a mudança?
Estas palavras são de Melissa Rodrigues, curadora, arte-educadora e ativista que trabalha atualmente como programadora na área de debates e discursos no Teatro do Bairro Alto (TBA), e colabora com outras instituições culturais, como o Batalha Centro de Cinema, no Porto. Em entrevista à MIL Magazine, diz que “não podemos pedir pela decolonialidade do sector cultural, quando a maior parte das pessoas que estão nos lugares de decisão são pessoas brancas e privilegiadas economicamente, e quem coloca estas questões nem compreende o que [significa o termo] decolonialidade. Não podemos avançar até à casa dez, quando o trabalho na casa zero não está feito”. A programadora questiona como se pode progredir para uma fase de decolonialidade se, na prática atual, existem desigualdades evidentes que necessitam de ser abordadas prioritariamente, semelhantes às que tem observado, em que frequentemente “corpos precários, racializados e dissidentes não recebem pagamento pela sua contribuição”, por exemplo, em festivais.
Já Indi Mateta, uma DJ angolana, a residir há um ano em Portugal, revelou que, embora tenha chegado ao país há cerca de um ano e meio, ainda se sente alheia a muitos aspetos internos. Até ao momento, diz não ter enfrentado barreiras ou preconceitos significativos, exceto quando se trata da “valorização financeira” do seu trabalho. Segundo a DJ angolana, os desafios que enfrenta derivam da conjuntura económica e social do país, “bem como das prioridades estabelecidas pela governação”. Observa que as indústrias criativas em Portugal ainda têm um longo caminho a percorrer e, por isso, a “cultura” não é tão valorizada quanto em outras realidades europeias, dificultando a dependência exclusiva da arte para sustento material. Por outro lado, baseando-se na realidade do seu país de origem, onde viveu até recentemente, Indi admite que tem encontrado mais oportunidades em Portugal. Ressalta que esta não é a realidade de todos, mas na sua experiência pessoal, principalmente como artista dedicada à música DJ e experimentadora de fusões rítmicas e sonoras, tem sido assim, “embora isso não signifique que as condições em Portugal sejam ideais”.
“Tudo isto que eu critico, faço-o num lugar confortável da crítica, por trabalhar nestas instituições e perceber como a maior parte delas funciona. Algumas realmente querem mudar, e algumas realmente estão a refletir, mas ainda é um trabalho longo”, afirma Melissa. Dá como exemplo o TBA, sítio no qual trabalha e onde, na direção artística liderada por Francisco Frazão, há há três assessores para a programação artística, dos quais duas pessoas são negras: “o responsável pela programação musical e eu, que cuido da programação dos discursos”. Esta diversidade na equipa indica uma mudança e transformação, considera, apesar de entender estas mudanças no sector como “lentas”. Além disso, as temáticas abordadas nos eventos e as pessoas convidadas são escolhidas com especial atenção e cuidado, refletindo uma consciência do que está a acontecer no mundo. Melissa Rodrigues comenta ainda que existem várias pessoas “a realizar um trabalho incrível” e a participar ativamente “no processo de alcançar algo mais plural e horizontal no âmbito das artes, algo que se pode denominar diversidade”. Acredita que o esforço exercido por esses agentes existe há muito tempo e, apesar de ainda ser em grande parte “invisível”, é fundamental. “Se não fosse por estas pessoas – atrizes, atores, artistas visuais plásticos, curadores, programadores – o cenário cultural deste país seria muito mais triste e homogéneo. Somos nós que estamos a impulsionar esta mudança, embora sejamos poucos nos lugares de destaque.”
Um exemplo disto foi o KILOMBO, com a curadoria das Aurora Negra, no São Luiz Teatro Municipal, em novembro de 2023, onde se celebrou a arte e a resiliência. mas também o Terreiro, organizado pela União Negra das Artes (UNA) que pretendia empoderar os profissionais antirracistas do sector cultural e promover a diversidade nos lugares de decisão; o Unidigrazz, um coletivo cultural urbano que promove práticas artísticas de artistas emergentes do concelho de Sintra, e também “o trabalho desenvolvido pela Raquel Lima, no Espaço Alkantara, o que eu estou a fazer no TBA, o que fiz no Hangar, o que faço no Porto, no Batalha, e em outros lugares, para além de muitas outras pessoas, como a coreógrafa e investigadora Vânia Gala, a artivista Belinha [Anabela Rodrigues], a socióloga Cristina Roldão, e também a investigadora e ativista Kitty Furtado”, elenca. E, apesar de reconhecer a “vantagem” de ocupar o cargo de programadora no TBA, nota que “o foco ainda está muitas vezes na branquitude”, mas que, pouco a pouco, “está a haver uma mudança em curso”. O mesmo confirma ROD, socióloga e artista visual, que menciona verificar mudanças graduais em instituições públicas. “A DGARTES, tendo certa autonomia em algumas áreas, tem tomado a iniciativa de convidar jurados de comunidades não hegemónicas, como a comunidade de pessoas negras e de pessoas trans”, conta ROD. Assim, procura diversificar os avaliadores das candidaturas e equilibrar a distribuição de financiamentos. “Embora ainda não tenhamos visto mudanças estruturais importantes, é positivo ver avanços nesse sentido”, diz.
Quem partilha da mesma opinião é Saya Mohamed, DJ com origens palestinianas, que nasceu na Galiza.
“Até agora, sinto que ainda não há abertura suficiente, especialmente na Galiza e, mais recentemente, percebo isso no Porto. Frequentemente, observamos apropriação cultural e tokenismo no mundo da cultura. Como alguém proveniente de uma família imigrante da Palestina, de cultura árabe e muçulmana, ocupar um espaço na música, produção musical e programação carrega um peso político significativo para mim; é uma forma de ativismo intrínseco à minha existência”, conta em entrevista. A DJ relata que, desde que se estabeleceu no Porto, começou a perceber aspetos que anteriormente não notava. Destaca que a diversidade populacional é mais visível do que na Galiza, evidenciando uma significativa presença de afrodescendentes e imigrantes. E essa diversidade, segundo a própria, manifesta-se também na cultura local, onde há um crescente apelo por maior representação desses grupos. Em comparação com o país onde nasceu, nota a presença de DJs angolanos e cabo-verdianos que tocam músicas das suas próprias culturas. Repara numa grande diferença no que toca à diversidade, comparando o Porto com a Galiza, mas alerta para “um problema”: “a comunidade racializada e migrante ainda está à margem. Há muita apropriação cultural por parte das pessoas brancas, tanto na música latina quanto em outros estilos, como kuduro, afrobeat ou afro house”.
O tokenismo e o branqueamento do conceito decolonial
O conceito de decolonialidade, por sua vez, foi branqueado e diluído. Nate Holder, músico, educador e autor britânico, explica que ao longo da história, algumas pessoas distorcem intencionalmente certas palavras, seja por manipulação deliberada ou ao repeti-las sem compreender as suas origens. “No entanto, este branqueamento assume a forma de condenação, diz que é errado e prejudicial, em vez de diluir o seu significado. Penso que se tornou numa espécie de ‘usamos a palavra para desacreditar a palavra’, em vez de ‘usamos esse conceito e alteramos ligeiramente a sua aplicação’”, afirma. Contudo, na perspetiva do músico, o termo decolonialidade está “mais forte do que nunca” devido à oportunidade de aprimorar o seu significado. “Este refinamento não reduz necessariamente o seu conceito, mas antes alarga a nossa compreensão do mesmo”, esclarece.
“A decolonialidade, na minha opinião, vai para além da abordagem do racismo. É preciso incluir várias formas de opressão, como a homofobia. Envolve o exame minucioso da pedagogia, a sua decomposição e a colocação de questões críticas sobre o objetivo da educação musical”, acrescenta Nate. O foco passa a ser não só servir o objetivo de obter um diploma, mas também estimular a educação para a justiça social, a saúde mental e adotar uma abordagem abrangente e de 360º graus à educação musical, desafiando-nos a ponderar as questões fundamentais: o que estamos realmente a fazer e qual é o objetivo final? O objetivo é criar uma experiência de aprendizagem individualizada para cada participante e assegurar que recebem não só o que precisam, mas, idealmente, também o que desejam, defende o músico britânico.
“É alcançar um equilíbrio mínimo na representação da sociedade como um todo. A questão da arte é que ela não escapa a esse efeito colonial, ela está intrinsecamente ligada a esse processo. Mesmo a arte não possui imunidade em relação a isso. Quando alguns artistas argumentam que a arte deve ser livre e não sujeita a entraves políticos para se manifestar como uma expressão genuína, muitas vezes são artistas que desfrutaram de privilégios na conceção da arte. Há uma conceção equívoca e comum de que a arte é um espaço neutro, quando, na realidade, não é”, avalia ROD.
Criar fissuras, questionar criticamente o que é feito e diversificar o currículo do ensino musical são formas de decolonialidade, mas não são decolonialidade em si, considera. “A verdadeira mudança depende da intenção por detrás dela.” Requer uma reflexão crítica sobre as ideias subjacentes ao conhecimento, à pedagogia e à crítica. Se essas ideias permanecerem inalteradas, não teremos feito uma mudança considerável. Nate Holder crê que, assim, corremos o risco de apenas “perpetuar a supremacia branca com uma cara castanha”.
Já ROD acredita que uma possível solução de decolonizar o sector seria permitir que as pessoas que assumem a liderança renunciassem dos seus cargos, cedendo espaço a outras e concedendo-lhes protagonismo. “Essa mudança poderia revitalizar o setor artístico, ao proporcionar oportunidades a novos rostos com diferentes perspetivas do mundo”, diz e adiciona que “a diversidade não se deve limitar apenas à inclusão de pessoas negras; deve-se também considerar a representação de povos indígenas, comunidades originárias, pessoas com deficiência, dissidentes de género e outros grupos marginalizados”.
Luan Okun destaca-se como um dos artistas que tem levado outras narrativas para os palcos de Lisboa. Utiliza nas suas performances a corpovivência como matéria artística, criando um manifesto em movimento e um ato de resistência que exploram questões relacionadas com a raça, imigração, género e representação do corpo. “Estou trazendo novas formas de pensar, abraçando diferentes perspetivas, formas de expressão e até o desconhecido. A minha arte pode realmente impactar esse espaço cultural”, afirma o artista. Uma forma de repensar a arte que ocupa espaços de maior visibilidade é abandonar as narrativas hegemónicas, já estabelecidas, e dar lugar a diversos artistas, defende. “Não se trata apenas de colocar pessoas nos mesmos lugares, mas de questionar as estruturas existentes. Quais são as outras possibilidades, as formas alternativas de mostrar arte?”, indaga.
Contudo, ao observar o sector cultural português em diversas áreas, começa-se a verificar a presença de algumas pessoas negras, artistas trans e uma participação de pessoas de diferentes nacionalidades em atividades culturais. Será legítimo afirmar que o sector cultural está verdadeiramente diversificado? ROD diz que não. Tal como explica, esta perceção cria uma ilusão para os dois lados: para os artistas representados, que acreditam que o sector está a evoluir, agora com maior visibilidade e oportunidades de trabalho, e para os diretores das instituições culturais, que pensam estar a implementar uma prática decolonial. “É uma ilusão, pois o controlo do financiamento, do poder e da programação não é transferido para o outro lado” — o lado dos artistas racializados e de grupos minoritários. “Embora haja uma representatividade maior em termos de artistas convidados, não há assentos para todos”, afirma. Há, portanto, uma necessidade premente de reavaliar as práticas curatoriais de várias instituições, sendo essencial “não apenas ser convidado, mas também ter a capacidade de convidar”, destaca. “A diferença é notável quando um curador branco convida um artista negro para expor ou participar num projeto, alegando que isso é uma prática decolonial. Contudo, isso muitas vezes representa apenas o tokenismo, utilizando a presença de uma pessoa negra, trans ou indígena.”
Este é um apelo que acredita ser possível fazer às instituições: a prática decolonial não se limita a convidar artistas; é preciso criar equilíbrios na gestão da cultura e da arte. Mas estes apelos são cansativos para alguns. “Temos há muito tempo discutido sobre as mesmas questões, mas, como já disse, as mudanças têm sido demasiado lentas e inconsistentes. É exaustivo falar constantemente do mesmo sem ver transformações reais. Cansaço que advém de debater as mesmas estruturas, imperfeições e ver sempre os mesmos grupos beneficiarem do nosso conhecimento, do nosso trabalho e das nossas lutas”, desabafa Melissa Rodrigues.
“Estou cansada de dizer que estou cansada, mas continuo a produzir. Esta é a contradição e o paradoxo: estou exausta, mas sei que devo continuar. Estamos num ciclo vicioso de cansaço e exaustão, e quanto mais cansados e exaustos ficamos, menos energia temos para continuar. É perigoso, pois são sempre os mesmos corpos – negros, racializados, não normativos de género e sexuais – que ficam esgotados. A máquina continua a funcionar, triturando-nos, enquanto acreditamos que estamos a ocupar espaços e a promover mudanças.”
Dentro do seu percurso ativista, a programadora compreende a importância de estar presente em todos os espaços, não apenas para ocupá-los, mas também para transformá-los. “Não me contento em apenas ocupar um lugar; quero contribuir para a reflexão e para um movimento de transformação”. Além disso, vê a sua atuação como uma parte integrante de um movimento mais abrangente e inserido num contexto mais amplo. Reconhece que, antes dela, muitas pessoas negras, especialmente mulheres, batalharam nos espaços que ocuparam, tanto em Portugal quanto em outros lugares, pavimentando o caminho para a posição como a que ocupa atualmente. Considera a sua participação como a continuidade de uma luta e de um pensamento que ultrapassa as barreiras do tempo e do espaço e acredita “no valor de continuar a criar, transformar e contribuir”.
Na sua perspetiva de agente de mudança na luta antirracista, percebe a importância de ocupar espaços de poder, algo que sucede de uma reflexão mais profunda: “queremos um lugar à mesa ou queremos construir as nossas próprias mesas?”, questiona. “Cada vez mais, quero construir a minha própria mesa, criar os nossos espaços e ter autonomia. Enquanto estamos neste processo de construção, é fundamental ocuparmos os espaços já estabelecidos, trazendo o que nós somos para eles. Como Angela Davis diz, uma mulher negra pode abalar toda a estrutura, então sinto que ao ocupar determinados espaços, posso fazer a estrutura repensar-se. Vejo o meu trabalho num sentido muito político, ligado a um pensamento artístico e curatorial, relacionando isso com o que está sendo pensado no mundo da arte, tanto em conteúdo quanto esteticamente, e fazendo uma ponte com o pensamento político.” Melissa Rodrigues percebe-se como um elemento de um processo muito maior do que ela própria, aspirando ser mais uma agente, mais um veículo para impulsionar as mudanças que espera ver no futuro – mudanças que gostaria de presenciar agora. Nos Estados Unidos, observam-se mulheres negras a ocupar estes espaços há muito tempo, resultado de uma luta mais antiga, tal como no Brasil, diz. “Este é o nosso momento, mas é fruto do trabalho daqueles que vieram antes de nós. Estamos a ocupar alguns lugares, mas ainda somos poucas. Questionamo-nos se realmente reconhecem o nosso valor ou se estamos apenas a alimentar uma lógica de tokenismo. Os gatekeepers desses espaços mantêm os seus privilégios e poder, e é importante refletirmos para não nos deixarmos ser tokenizados.”
Desafiar a visão artística europeia
A arte produzida por pessoas que não pertencem à cultura ocidental muitas vezes é desvalorizada ou ignorada pelo olhar eurocêntrico, que considera a arte ocidental como o padrão de excelência e universalidade. Essa visão preponderante e supressora da arte marginaliza e exotiza as expressões artísticas de outras culturas, que possuem as suas próprias histórias, tradições, estéticas e valores.
Também ROD enfrentou várias situações de “colonialismo ativo”. Um exemplo disso, foram as reações agressivas e de xenófobas que recebeu devido à obra da sua autoria Não foi descobrimento, foi matança que esteve exposta na mostra Interferências do Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT). Mas ROD ressalta uma outra situação que lhe chamou especialmente a atenção: a necessidade de adaptar a sua carreira às expectativas de júris que desconhecem o contexto de onde vem. “Venho de um ambiente de precariedade e falta de conexões no meio artístico, e sinto que tenho de moldar minha carreira conforme as expectativas de curadores e júris que avaliarão meus projetos”, lamenta. Ao submeter uma candidatura, por exemplo, sente a obrigação de entregar um produto que satisfaça as expectativas daqueles que farão a avaliação, geralmente pessoas brancas europeias, inseridas num contexto muito diferente do seu.
Motivado por um dilema pessoal, Nate Holder defende uma reflexão decolonial sobre a educação musical. Foi durante a dissertação da sua licenciatura em música, que se dedicou ao estudo de um estilo musical de Barbados, terra de parte da sua família, para compreender as raízes da sua identidade. “Descobri factos maravilhosos e outros mais difíceis de aceitar sobre a história do meu país de origem”, relatou em entrevista. Ao ser um dos poucos estudantes negros da escola, o músico conta que enfrentou vários comentários e atitudes racistas. “Às vezes, as pessoas diziam ou faziam coisas que me pareciam horríveis. E eu não tinha vocabulário para me defender naquela altura.” Agora, como pai, espera criar um ambiente escolar inclusivo para as suas filhas. “Não quero que elas sofram com a mesma falta de representação que eu sofri” declarou, salientando a importância de proporcionar um ambiente onde elas se vejam representadas e inspiradas por mulheres negras que tiveram sucesso em diversas áreas. E acrescenta: “É importante que as minhas filhas percebam não só o potencial para realizar as suas aspirações, mas também que os seus professores compreendam e atendam as suas necessidades. A educação musical vai além da habilidade técnica; tem também um papel fundamental em ajudar a compreender a identidade, a expressá-la e a impulsionar a mudança social por meio da música que aprendemos e nos inspira.”
Desafiar a visão eurocêntrica hegemónica da arte é um dilema, tanto para artistas que foram colonizados por essa estética, quanto para os que integram a cultura europeia. Nas escolas de arte, um desafio para professores é encontrar novas visões e produções de conhecimento, distintas do que tradicionalmente é ensinado. O panorama contemporâneo da arte, muitas vezes, reflete uma repetição autofágica, em que uma crítica estabelecida por um grupo específico de pessoas, cujas identidades estruturais são conhecidas, dita o entendimento global de arte, explica ROD. Essas pessoas moldam as perceções dos consumidores, instruindo-os a julgar a arte com base numa visão estreitamente europeia.
Assim, torna-se ainda mais difícil falar sobre “a decolonialidade da estética da arte europeia” e produzir uma estética alinhada a uma “cosmovisão diferente”.
A estrutura de marginalização no setor artístico e a dificuldade enfrentada por artistas de culturas não europeias, destacadas por ROD, assemelham-se ao debate da mesa-redonda do MIL, onde o cantor Luca Argel colocou em questão a viabilidade de se criar algo novo e positivo dentro de um sistema estruturalmente orientado para a marginalização. O cantor propôs a ideia de se “infiltrar no sistema”, com o objetivo de desmantelar os seus mecanismos, porém a partir de uma reflexão externa que permita a construção de algo genuíno. Alertou para o risco de, ao envolver-se com o sistema, se adotarem inadvertidamente os seus modos de pensar, salientando a necessidade de abordagens mais radicais que procurem soluções para além dos limites estabelecidos. José Augusto Pereira, complementando este raciocínio, sublinhou que a decolonialidade implica processos de luta e mobilização que desafiam a estrutura social do capitalismo, levantando a questão: “Serão as conquistas [da decolonialidade] consolidadas e permanentes sem uma reorganização da sociedade?”
English Version
This perspective, developed by thinkers such as sociologist Aníbal Quijano, semiologist Walter Mignolo and scholar Catherine Walsh, deepens our understanding of the concept from various angles and disciplines, contributing significantly to the analysis of decoloniality – an approach that defies and seeks to deconstrue colonialism’s power structures, transforming the forms of knowledge, power and being shaped by its logic. By challenging these established forms of knowledge, it suggests the valuing of knowledge, cultures and identities that were marginalised or suppressed, proposing a world where multiple epistemologies and experiences may coexist and be recognized. This line of thought was the starting point for the roundtable debate held at the convention in the 2023 MIL festival, in a discussion around the ability of cultural institutions to free themselves from the logics of power and historical Eurocentric hegemony on which the cultural sector is grounded.
In their reflection during the festival’s round-table, the historian and antiracist activist José Augusto Pereira explained how the Harlem Renaissance, an Afro-American cultural movement that emerged at the beginning of the 20th century, is an example of the dialectical tension between centre and periphery, since this artistic expression produced by black people “would not have been possible without the reality of discrimination experienced during that period”. After the civil war ended in 1865, hundreds of thousands of Afro-Americans recently freed from slavery in the South, found themselves under the dominion of the “Jim Crow” racial segregation laws, which transformed them into second-class citizens. Victims of racial hate, lynching and terror campaigns orchestrated by groups such as the K Klux Klan (KKK), they were forced to flee the South, settling in cities like Chicago, Los Angeles, Detroit and New York. At that time, the borough of Harlem, New York, stood out as the area with the highest concentration of Afro-Americans, reaching almost 175 thousand residents. From unqualified workers to educated middle classes, they shared experiences of slavery, emancipation and racial oppression, as well as the determination to create a new identity as free persons – and thus the Harlem Renaissance was born. Marked by the significant growth of the Afro-American community’s artistic and intellectual expression, this cultural, social and artistic movement sought to break with cultural homogeneity, extolling black pride in America during the 1920s and 1930s.
Cultural and artistic manifestations such as the Harlem Renaissance become forms of resistance to those processes and do not occur in sites that are perceived as central, despite engaging in a confrontational dialogue with the centre. And up until today, we are still dealing with the construction of centre and periphery.
From Luca Argel’s perspective, the cultural industry works ethnocentrically, or in other words, gauges other cultures based on the standards and values of its own culture, considered as superior or “normal”. During the debate, this musician pointed out the “world music genre” as “one such “materialised expression of ethnocentrism” within the cultural sector. Used to label music that doesn’t fit into the conventional categories of western popular music – positioned as neutral – the term was originally coined in the 1980s, in London, to commercialise African music popularised by Paul Simon’s album Graceland. It rapidly came to describe any form of music outside the mainstream genres like pop rock, jazz and classical. However, several critics have argued that this categorization is oversimplistic, that it perpetuates cultural stereotypes and ignores the diversity and complexity of global musical traditions, thus reproving its use as anachronistic and offensive in an increasingly globalised world, where musical influences are constantly crossed.
Luca Argel stresses that “ultimately, [institutions] are only superficially interested in giving these issues some visibility, and only insofar as they can be turned into a [profitable] content.” Reflecting upon the words of rapper Xullaji, he highlights that the simple consumption of black and Roma culture is not tantamount to significant advancements in the respect for those minorities’ human rights. Allowing only a superficial progress in this discussion does not incite a critical reflection around the hegemony and privileges predominantly held by rich, white, cishet men, never reaching the point of truly questioning those who detain those privileges.
A long way from change?
Thus spoke Melissa Rodrigues, a curator, art-educator and activist who currently works as the programmer of debates and discourses in the Lisbon’s Bairro Alto Theatre (TBA) and collaborates with other cultural institutions, such as Porto’s Batalha Centro de Cinema. Interviewed by MIL Magazine, Rodrigues states that “we can’t expect the decoloniality of the cultural sector, when the majority of the persons in decision-making positions are rich white people and those who pose these questions don’t even understand the meaning of the term decoloniality. We can’t jump forward to square ten when the work in square one hasn’t been done yet”. The programmer questions how it is possible to advance to a stage of decoloniality if there are still obvious inequalities in the present practice that must first be addressed, referring to situations she has observed, as for instance in festivals where frequently “precarious, racialized and dissident bodies don’t receive payment for their contribution”.
In her turn, the Angolan DJ Indi Mateta, who’s been living in Portugal for a year, revealed that, despite having arrived in Portugal about a year and a half ago, she still feels an outsider to many of the country’s internal features. So far, she claims not to have faced significant barriers or prejudices, except when it comes to the “financial valuing” of her work. According to the Angolan DJ, the challenges she faces stem from the country’s economic and social juncture, “as well as by the priorities set by governance”. She observes that creative industries in Portugal still have a long way to go and, therefore, “culture” is not as valued as in other European settings, making it hard to depend solely on art for material sustenance. On the other hand, comparing to the situation in her country of origin, where she lived until recently, Indi admits that she’s found more opportunities in Portugal. She points out that not everyone is in the same situation, but in her personal experience, mainly as an artist devoted to DJing and experimenting with rhythmic and sonority fusions, it has been like that, “although in doesn’t mean that conditions in Portugal are ideal”.
Melissa claims that “all these criticisms I make, come from the comfortable position of the critic, from working inside these institutions and knowing how most of them operate. Some of them truly want to change and some are really doing serious reflection, but we still have a long work ahead of us”. She gives the example of TBA, where she works and whose artistic direction, headed by Fancisco Frazão, has three art programming advisors, two of whom are black persons; “the person in charge of music programming and me, taking care of the discourses programme”. The team’s diversity points to a shift, Melissa believes, despite considering that these kinds of changes in the sector are typically “slow”. The topics addressed in the events and the invited guests are also chosen with special care to reflect an awareness of what is going on in world, Melissa Rodrigues goes on to mention the various persons who are “doing an amazing job” and actively engaged “in the process of achieving a more plural and horizontal situation in the sphere of the arts, something akin to diversity”. She believes the effort exerted by such agents has existed for a long time and, albeit still mostly “invisibly”, it is nevertheless essential. “If it weren’t for these persons – actresses, actors, visual artists, curators, programmers – this country’s cultural scene would be much poorer and homogeneous. We are the ones bolstering this change, even though there’s few of us in positions of prominence.”
And she names some notable cases: one such example was KILOMBO, curated by Aurora Negra at Lisbon’s São Luiz Theatre during the month of November, which celebrated art and resilience, but also Terreiro, organised by União Negra das Artes (UNA), which sought to empower antiracist professionals in the cultural sector and promote diversity in decision-making positions; Unidigrazz, an urban cultural collective that promotes the artistic practice of emerging artists from the Sintra council; or the work “developed by Raquel Lima at Espaço Alkantara, the work I’m doing at TBA and used to do at Hangar, or what I do in Porto, at Batalha and other places, amongst many other persons, like choreographer and researcher Vânia Gala, artivist Belinha [Anabela Rodrigues], sociologist Cristina Roldão, as well as researcher and activist Kitty Furtado”. And despite acknowledging the “advantage” of occupying a position as programmer at TBA, Melissa notes that “the focus is still mostly on ‘whiteness’ even though, little by little, “there is a change going on”. The same is confirmed by ROD, sociologist and visual artist, who mentions having noticed gradual changes in public institutions. ROD explains that “DGARTES, for instance, given its autonomy in certain areas, has taken the initiative inviting jurors from non-hegemonic communities, such as black or trans communities”. It thus seeks to diversify the evaluators of proposals and balance the distribution of funding. “Although we have still not seen major structural changes, it’s positive to see some progress in that direction”, they say.
Someone else who shares the same opinion is Saya Mohamed, a DJ of Palestinian descent born in Galicia.
”Right now, I feel there isn’t sufficient openness yet, especially in Galicia and more recently I have found the same to be true of Porto. Very often we encounter a cultural appropriation and tokenism in the cultural world.” Saya explains that, as someone born into a Palestinian immigrant family, of Muslim and Arab culture, occupying a space as a musician, musical producer and programmer, carries a significant political weight for her, “it’s a form of activism inherent to my existence”. This DJ recounts how, since she settled in Porto, she started becoming aware of things she hadn’t noticed before, emphasising the greater populational diversity in comparison to her home town of Galicia, particularly the significant presence of people of African descent and immigrant populations. According to Saya, this diversity also reflects on the local culture, where there’s an increasing demand for greater representation of these groups. In comparison to her country of birth, she notices the presence of Angolan and Cape-Verdean DJs who play music from their own cultures. She finds a huge difference, diversity-wise, between Porto and Galicia, although she alerts us to “a problem”: “racialized and migrant communities are still relatively marginalised. There is a lot of cultural appropriation on the part of white people, both in Latin music and other styles, such as kuduro, afrobeat or afro house”.
Tokenism and the whitewashing of the decolonial concept
In turn, the concept of decoloniality has been whitewashed and diluted. Nate Holder, a British musician, educator and author, explains that throughout history, some people have intentionally distorted certain words, whether as a deliberate manipulation or by repeating them without understanding their origin. “However, this whitewashing takes the form of a condemnation, claiming it’s wrong and harmful, rather than diluting its meaning. I think it has resulted in something like ‘using the word to discredit the word’, instead of ‘using the concept and slightly altering its use.’” In the musician’s opinion, the term decoloniality is, nevertheless, “stronger than ever”, since it’s been possible to refine its meaning, “This refinement doesn’t necessarily restrict its meaning, but rather broadens our understanding of it”, he clarifies.
“In my opinion, decoloniality exceeds the question of racism. It must include various forms of oppression, such as homophobia. It involves a meticulous examination of pedagogy, its deconstruction and questioning of critical issues regarding the goals of music education”, Nate adds. The focus has to shift from simply aiming to confer a degree, to promoting an education for social justice, mental health and adopting a broad 360º approach to music education, challenging us to reflect upon crucial issues: what are we really doing and what’s the ultimate goal? The goal is to provide a personalized learning experience for each participant and to ensure they receive, not just what they need, but ideally also what they desire, defends the British musician.
“It’s about reaching a minimum balance in the representation of society as a whole. The problem with art is that it does not escape the colonial effect, it’s intrinsically connected to that process. Even art isn’t immune to it. Artists who argue that art should be free and unconstrained by political barriers as a manifestation of genuine expression, are very often those who benefit from privileges in their art practice. There’s a common erroneous idea that art is a neutral space when it really isn’t”, ROD concludes.
ROD, in turn, believes that a possible solution to decolonize the sector would be to make it possible for those in leadership roles to step down and make space for others to assume greater prominence. “Such a change could revitalize the artistic sector, giving opportunities to new faces with different worldviews”, ROD says, adding that “diversity must not merely restrict itself to the inclusion of black people; it should also contemplate the representation of indigenous people, originating communities, people with disabilities, gender dissidents and other marginalised groups”.
Luan Okun stands out as one of the artists who have brought other narratives onto the Lisbon stage. He uses his performances and bodily experience as his artistic matter, creating a moving manifesto and an act of resistance to explore issues related with race, immigration, gender and body representations. “I’m exploring new ways of thinking, embracing different perspectives, forms of expression and even the unknown. My art can really have an impact on that cultural space”, the artist claims. One way of rethinking the kinds of art that achieve greater visibility is to abandon hegemonic, established narratives, and make space for different kinds of artists, they defend. “It’s not just about replacing people in the same places, but questioning the existing structures. What are the other possibilities, the alternative ways of showing art?”, he asks.
However, when we consider the Portuguese cultural sector across its different areas, we begin to notice the presence of some black persons, trans artists and the participation of people from different nationalities in cultural activities. Can we legitimately claim the cultural sector to be truly diversified? ROD doesn’t think so. As they explain, this perception creates an illusion on both sides: on the part of those artists who are represented, who believe the sector to be evolving, with greater visibility and work opportunities, and on the part of cultural institution directions, who become convinced they are implementing a decolonial practice. “It’s an illusion, since the control over financing, power and programmes is not changing hands” – into the hands of racialized artists and minority groups. “Although there is greater representativity in terms of invited artists, there aren’t enough places for everyone”, they claim, pointing out the urgency of reappraising the curating practices of many institutions, in order to give these artists “the power to invite, and not merely to be invited”. “It makes a significant difference, when a white curator invites a black artist to exhibit or participate in a project, alleging that it’s a decolonial practice. Very often, it is just an expression of tokenism, exploring the presence of black, trans or indigenous persons.”
ROD believes it’s possible to demand this from institutions: decolonial practice is not just about inviting artists; it’s necessary to strike a balance in the management of culture and art. But for some, these demands become wearisome. “We have been discussing these issues for a long time, but as I’ve said, changes have been too slow and inconsistent. It’s exhausting to be constantly talking about the same things without seeing any real change happening. An exhaustion caused by fighting the same structures, the same imperfections, and constantly seeing the same groups benefiting from our knowledge, our work and our battles”, Melissa Rodrigues complains.
As an activist, the programmer understands the importance of being present in all spaces, not just to occupy them, but to transform them. “I’m not content simply to occupy a space; I want to contribute to reflection and to a transformation movement.” Beyond that, she views her actions as an integral part of a larger movement within a broader context. She recognizes that, before her, many black people, especially women, battled for the spaces they occupied, both in Portugal as in other places, paving the way for their current positions. She conceives her participation as the continuation of a fight and a thought that transcend the barriers of time and space, believing “in the value of persistence in creating, transforming and contributing”.
From her perspective as an agent of change in the antiracist fight, she understands the importance of occupying places of power, as a consequence of a deeper reflection: “do we want a place at the table, or instead, to build our own tables?”, she asks. “Increasingly, I want to build my own table, create our own spaces and conquer independence. While we’re engaged in this building process, it’s essential to occupy already established spaces, bringing ourselves to them. As Angela Davis says, when a black woman moves, the whole structure of society moves with her, and so I believe that when I occupy certain spaces, I can make the structure rethink itself. I view my work in a very political sense, connected to an artistic and curating thought as they relate to the artworld’s current concerns, both aesthetically as in terms of content, building a bridge with political thought.” Melissa Rodrigues conceives of herself more as a vehicle for propelling the changes she expects to see in the future – changes she would love to witness in the present. In the United States, we have witnessed black women occupy these spaces for a long time, as the result of an older struggle, such as in Brazil, she says. “Our moment has come, but it emanates from the work done by those who came before us. We have managed to occupy some places, but we are still very few. We ask ourselves if we are being truly recognized for our value or whether we are just fostering the logic of tokenism. The institutional gatekeepers continue to maintain their privileges and power, and it’s important topromote a reflection that prevents us from becoming tokenized.”
Challenging the European artistic vision
The art produced by people who don’t belong to western culture is often dismissed or ignored by the Eurocentric gaze, which considers western art as the standard of excellence and universality. This pervasive and suppressive vision of art, marginalises and exoticizes other cultures’ artistic expression forms, with their own histories, traditions, aesthetics and values.
So, my art doesn’t reach those spaces. Since throughout life, my artistic practice has been delegitimized as an art form, I say, alright then, lets embrace it and adapt to that non-place.”
ROD has also faced various situations of “active colonialism.” An example of that, were the aggressive and xenophobic reactions they received as the author of the work It wasn’t discovery, it was slaughter displayed in the exhibition Interferências, at the Museum of Art, Architecture and Technology (MAAT). But the artist highlights another situation that caught especially their attention: the need to adapt their career to the expectations of juries which are ignorant of its context. “I come from an environment of precariousness and lack of ties to the artistic world, and I feel that I have to shape my career according to the expectations of curators and juries who evaluate my projects”, they regret. Whenever they submit a proposal, for instance, ROD feels compelled to deliver a product that will satisfy the expectations of those who will appraise it, generally white European persons who belong to a very different context from theirs.
Motivated by a personal dilemma, Nate Holder upholds a decolonial reflection around music education. It happened during her music dissertation, which focused on the study of a musical style from Barbados, where part of her family comes from, as a means to grasp the roots of his identity. “I discovered wonderful facts and other that were harder to accept about the history of my country of origin”, he recalled. As one of the few black students at the school, the musician says he faced several racist attitudes and remarks. “Sometimes, people would say or do things that seemed horrible to me. And I didn’t have the vocabulary to defend myself at the time.” Now, as a parent, he hopes to provide an inclusive school environment for his daughters. “I don’t want them to suffer the same lack of representation I suffered”, he declared, pointing out the importance of providing an environment where they feel represented and inspired by black women who were successful in different fields. And he adds, “It’s important, not only that my daughters realize the potential to achieve their aspirations, but also that their teachers are aware and attend to their needs. Music education is more than technical expertise; it also plays an essential role in helping to understand our identities, to express them and drive social change through the music we learn and are inspired by”.
Challenging the hegemonic Eurocentric conception of art is a problem both for artists who were colonised by this aesthetic, as for those who belong to European culture. In art schools, teachers face the challenge of finding new visions and forms of knowledge, different from those that are traditionally taught. The contemporary art world, ROD explained, often reflects an autophagic repetition, where the critical discourse voiced by a very specific group of people, whose structural identities are familiar, dictates the global understanding of art. Those people shape consumers’ perceptions, instructing them to judge art based on a strictly European vision.
Thus, it becomes even harder to speak about “the decoloniality of European art aesthetics” and to produce an aesthetic aligned with a “different cosmovision”.
The structure of marginalisation within the artistic sector and the difficulty faced by artists from non-European cultures, highlighted by ROD, resemble the debate at the MIL roundtable, where the singer Luca Argel questioned the viability of creating something new and positive within a system that is structurally biassed toward marginalisation. The singer advanced the idea of “infiltrating the system” with the aim of dismantling its mechanisms, but stemming from an outside reflection that will enable to build something genuine. He alerted to the risk posed by an involvement with the system, of inadvertently adopting its modes of thinking, stressing the need for more radical approaches that search for solutions beyond the established limits. Completing this thought, José Augusto Pereira emphasised that decoloniality implies struggles and movements that defy the capitalist social structure, raising the question: “Will the conquests [of decoloniality] become consolidated and permanent without the reorganisation of society?”
/ Translation by Diogo Freitas Costa