2022Opinion

Trabalhadores cantam Revolução: Notas do Sri Lanka

By October 21, 2022October 28th, 2022No Comments
Autor

Imaad Majeed

Imaad Majeed é artista multidisciplinar, curadore e escritore, de Colombo, no Sri Lanka. Assume a direcção e a curadoria da plataforma de performance trilingue KACHA KACHA. É curadore de projectos e co-curadore da Thattu Pattu, uma plataforma para música das periferias do Sri Lanka. Faz parte do colectivo de artistas The Packet e VJ/DJ da Packet Radio (SUPR FM). Gosta de fazer playlists e de escrever sobre música do Sri Lanka para o blogue internacional de música beehype.
* Imaad assume-se como uma pessoa não binária, por isso utilizamos “curadore” e “escritore” em vez dos pronomes masculinos e femininos

Imaad Majeed is a multidisciplinary artist, curator and writer, based in Colombo, Sri Lanka. They are Director and Curator of the trilingual performance platform KACHA KACHA. They are Project Coordinator and Co-Curator of Thattu Pattu, a platform for music from the fringes of Sri Lanka. They are one part of the artist collective The Packet and VJ/DJ of Packet Radio (SUPR FM). They enjoy making playlists, and writing about musicians from Sri Lanka for the international music blog beehype.

A 11 de Abril, o rapper Rude Bwoy interpretou o tema de Bob Marley Get Up Stand Up, no meio de uma multidão de manifestantes na capital do Sri Lanka. Segundo ele, foi um momento pelo qual esperara toda a vida – uma centelha de revolução. Desmaiou pouco tempo depois, sucumbindo a um ataque cardíaco.

No meio do colapso económico e da crise política, o Sri Lanka viveu este ano o seu maior movimento de protesto, com trabalhadores, estudantes, artistas, activistas, trabalhadores domésticos e crianças, unidos para afastar do poder a família Rajapaksa, que se tinha enraizado no Estado. O que começou como manifestações esporádicas por todo o país, viria a culminar numa aldeia de protesto no “local de agitação” designado pelo Estado. Aqui, uma confluência vibrante de comunidades encontrou espaço para conversas, imaginando uma nação diferente e uma relação diferente com a governação.

Houve algumas canções de protesto notáveis que surgiram deste movimento, de músicos como OJ Da Tamil Rapper, Bo Sedkid, Namini Panchala, Indika Upamali, RIIS, PVG, GTV e Zany Inzane. Havia também muitos músicos no terreno que estavam envolvidos na organização de esforços. Concentremo-nos num colectivo, entre centenas, e naquilo que eles foram capazes de obter em colaboração com outros.

O colectivo multidisciplinar de artistas NO NAMES, que inclui músicos, foi fundamental para a criação do Colégio GotaGoGama na aldeia de protesto. A ênfase era encorajar a aprendizagem e a partilha de conhecimento pelos trabalhadores, para os trabalhadores. Trata-se de uma extensão natural da visão que o colectivo tem de partilha de conhecimento e de competências entre disciplinas. Os artistas também facilitaram discussões fora do GotaGoGama, viajando para diferentes partes do país. No colégio, as sessões incluíam espectáculos e círculos de diálogo, explorando o pessoal e o político.

Enquanto a maior parte do discurso teve lugar em Sinhala, houve sessões em inglês e tâmil. Um dos esforços para encorajar o multiculturalismo e o multilinguismo foi a iniciativa Talking about Tamil songs in Sinhala [Falar sobre canções Tâmil em Sinhala], uma sessão popular no Colégio onde o cineasta tâmil King Ratnam explorou canções de cinema tâmil. Segundo um membro do colectivo NO NAMES, “mesmo entre os racistas encontramos pessoas que se dedicam à produção cultural de outras culturas. Desta forma, aprofundamos o seu envolvimento com questões exploradas nestas canções.”

Quando questionados sobre a razão por que se concentravam nos trabalhadores e não apenas nos artistas para este tipo de ação, um membro do colectivo explicou que “as pessoas pensam que a aprendizagem acontece em instituições de educação com o objectivo de arranjar um bom emprego. Mas a verdade é que aprendemos através da comunidade, através da interação com os outros na sociedade”.

A 18 de Maio, data que marca o fim do conflito civil de 30 anos no Sri Lanka entre o estado budista Sinhala e os separatistas tâmiles, Swasthika Arulingam, a Secretária Adjunta do Sindicato dos Trabalhadores Comerciais e Industriais, cantou uma rendição tâmil de Hum Dekhenge, um popular nazm urdu, escrito pelo poeta paquistanês Faiz Ahmad Faiz sobre um dia de ajuste de contas.

A aldeia de protesto foi, entretanto, desmantelada quando o recém-nomeado Presidente impôs uma onda de repressão contra os dissidentes. Isto não augura nada de bom para o futuro da liberdade de expressão num país onde, no passado, jornalistas, activistas e artistas foram alvos de violência do Estado e objeto de detenções, assassinatos e desaparecimentos forçados. Ainda assim, os artistas continuam a optar pela verdade face ao poder.

English Version

Workers Sing Revolution: Notes From Sri Lanka

On April 11, rapper Rude Bwoy performed Bob Marley’s Get Up Stand Up, amidst a crowd of protestors in Sri Lanka’s capital. He said he had waited for a moment like this all his life – a spark of revolution. He collapsed soon after, succumbing to a heart attack.

Amidst economic collapse and political crisis, Sri Lanka experienced its largest protest movement this year, with workers, students, artists, activists, homemakers and children, all coming together to chase away the Rajapaksa family that had entrenched itself into the state. What began as sporadic protests across the country, then culminated in a protest village at the state-appointed “agitation site”. Here, a vibrant confluence of communities found space for conversations, imagining a different nation and a different relationship to governance.

There have been some remarkable protest songs that have emerged from this movement, by the likes of OJ Da Tamil Rapper, Bo Sedkid, Namini Panchala, Indika Upamali, RIIS, PVG, GTV and Zany Inzane. There were also many musicians on the ground who were involved in organising efforts. Let’s focus on one collective, among hundreds, and what they were able to bring to fruition collaboratively with others.

The multidisciplinary artist collective NO NAMES, which includes musicians, were instrumental in setting up the GotaGoGama College at the protest village. The emphasis was to encourage learning and sharing of knowledge by workers, for workers. This was a natural extension of the collective’s vision of knowledge and skill sharing across disciplines. They facilitated discussions outside of the site as well, travelling to different parts of the country. Sessions at the college included performances and dialogue circles, exploring the personal and the political.

While most of the discourse took place in Sinhala, there were sessions in English and Tamil. One of the efforts to encourage multiculturalism and multilingualism was Talking about Tamil songs in Sinhala, a popular session at the College where Tamil filmmaker King Ratnam explored Tamil cinema songs. A member of NO NAMES said, “Even among racists you find people who engage with cultural production from other cultures. This way we deepen their engagement with issues explored in these songs.”

When asked why they focused on workers and not just artists for these efforts, a member of NO NAMES said, “People think learning happens at educational institutions with the goal of getting a good job. But the truth is that we learn through community, by interacting with others in society.”

On May 18, a date that marks the end of Sri Lanka’s 30 year civil conflict between the Sinhala Buddhist state and Tamil separatists, Swasthika Arulingam, the Deputy Secretary of the Commercial and Industrial Workers Union, sang a Tamil rendition of Hum Dekhenge, a popular Urdu nazm, written by the Pakistani poet Faiz Ahmad Faiz, which speaks of a day of reckoning.

The protest village has now been cleared away, as the newly appointed President enforced a crackdown on dissenters. This does not bode well for the future of freedom of expression in a country where journalists, activists and artists have been targets of state violence (including imprisonment, assassination and enforced disappearance) in the past. Still, artists continue to speak truth to power.

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